Mulheres e o descanso: quais desafios enfrentamos pelo caminho?

Por Marcela | Psicóloga

Até bem pouco tempo atrás, descansar para mim era sinônimo de dormir. Quando o cansaço batia, o que eu mais ansiava era encaixar um cochilo no meio do dia, ou ficava na expectativa de chegar a noite para dormir mais cedo. Porém, em muitos momentos, mesmo após acordar, o que deveria ter sido um sono reparador parecia ter efeito contrário. Acordava ainda mais cansada, com aquela sensação de corpo pesado. Essa época coincidiu com um período de maior sedentarismo e muitas demandas. Coincidentemente (ou não!) quando me propus a retomar os exercícios físicos e consegui reorganizar minha rotina para isso, a disposição veio e a sensação de cansaço acumulado diminuiu um pouco.

Se você também é uma pessoa que associa o descanso ao sono, então esse texto é um convite para ampliar suas possibilidades. Espero ter você comigo até o final!

De antemão te aviso que aqui você não verá frases como: “para descansar basta querer!”. Porque, em se tratando de mulheres, sobretudo as que são mães, para ter descanso não é preciso somente desejo. É necessária uma baita organização para que isso seja possível.

Mulheres, principalmente as que são mães, assumem muito mais tarefas domésticas e de cuidado comparado a seus companheiros, quando pensamos em relações heterossexuais. Ao todo, mulheres gastam, em média, 61 horas com trabalho não remunerado no Brasil (ver mais em https://lab.thinkolga.com/economia-do-cuidado/ ). 

Então essa é uma conversa sobre descanso que não dá para deixar de lado a inclusão de pautas como a divisão mais igualitária de tarefas domésticas, do cuidado com os filhos, maior acesso das mulheres aos direitos básicos, equidade salarial e muitas outras coisas.

Para além dessa desigualdade entre homens e mulheres, também é preciso considerar que na nossa sociedade, a produtividade é exaltada. Logo, o descanso é visto como perda de tempo, como inutilidade. Quem nunca pensou na frase: “ufa, descanso merecido!” após terminar uma lista de tarefas da qual se propôs a realizar? Essa é uma armadilha que caímos e que tende a postergar nossos momentos de descanso. Porém, não deveria se tratar de um merecimento, descansar é uma necessidade básica.  

Mulheres cansadas são facilmente levadas a viver no piloto automático, a consumir mais na busca de tentar satisfazer alguma necessidade e, sair dessa lógica que nos engole exige um esforço.

Estar consciente disso é o primeiro passo para um movimento ativo em busca de maior espaço, com direito ao ócio, ao lazer, à improdutividade para nos dar fôlego de existir e não só sobreviver. 

Agora, gostaria de propor uma reflexão sobre você, sobre seus hábitos e as possibilidades que podem surgir. Pode ser desafiador pensar em algumas mudanças, mas também é urgente e necessário.

Esse então é um convite a olhar para si, para ampliar sua percepção e encontrar formas de descanso que façam sentido para você. Podemos pensar em alguns tipos de perfis que com isso, irão precisar de tipos de descanso diferentes. Lógico que aqui, faço uma divisão didática, mas acredito que pode te ajudar a refletir sobre o tipo de descanso que você busca e se ele, de fato, tem te possibilitado repousar.

Se você é uma pessoa que exerce muitas tarefas que exigem do seu corpo, possivelmente o repouso ou as atividades que ajudam a desacelerar as funções corpóreas e produzem um relaxamento podem ser bem-vindas. Alguns exemplos: exercícios de relaxamento, alongamentos, leitura, ouvir música, um banho relaxante, entre outros.

Já se você é uma pessoa em que uma grande parte de suas tarefas exigem um trabalho mais intelectual, talvez você precise de outras maneiras de relaxar. Nessas situações, a necessidade é a de reduzir os estímulos mentais, então movimentar o corpo pode ser uma boa pedida. Fazer atividades físicas, estar em contato com a natureza, fazer pausas e praticar a atenção plena no aqui e agora, fazer atividades manuais, praticar algum hobby, reduzir o tempo em frente a telas podem ser algumas sugestões interessantes.

Muitos são os fatores que podem interferir no nosso descanso, digo isso porque para poder descansar também será preciso colocar limites em suas relações e falar alguns “nãos” necessários, mesmo que isso desagrade à alguém.

Também pode ser preciso olhar para sua autocobrança, aquela que sopra no seu ouvido que tudo poderia estar melhor executado do que está agora, aquela que impera com a necessidade das coisas serem perfeitamente equilibradas. É ilusório pensar que será possível dar conta de tudo e todos e para poder se priorizar em vários momentos será necessário escolher qual pratinho você vai conseguir equilibrar e quais ficarão no chão. 

Se não olharmos também para essas questões, quem continuará exausta e sobrecarregada será você!

Existe outro ponto nessa história que também merece atenção: poder descansar é também passar um tempo de qualidade somente na sua presença. 

Para muitas pessoas, ficar sozinha pode trazer à tona sensações desagradáveis como ansiedade, solidão, sentimentos de vazio, desamparo e alguns outros.

A capacidade de ficar só parece simples mas requer algo sofisticado em termos de amadurecimento emocional que vamos desenvolvendo e aprendendo desde crianças, quando outras pessoas cuidam de nós e dão a oportunidade de estar conosco sem uma presença que invada. Nesses momentos, a criança pode experimentar uma sensação de maior integração, uma oportunidade de exercer sua capacidade criativa e desenvolver seu mundo pessoal.

Mas se não aprendemos isso na infância então está tudo perdido? A boa notícia é que sempre é possível aprender! Então o meu convite aqui é para que você se perceba: o que sente nesses momentos? É confortável ou não?

E mesmo não sabendo muito como fazer ou sendo desconfortável no início, persistir em ter momentos com você mesma pode ser de uma riqueza muito grande, porque te dá a chance de ter mais notícias sobre si. É se conhecendo melhor que você conseguirá identificar suas necessidades e agir de forma a atendê-las. 

Também quero te lembrar que você não precisa estar sozinha para cuidar de você. Se você se percebe sofrendo, com um nível de sobrecarga ou exaustão exacerbados, receber ajuda profissional pode ser um bom começo. Ter alguém para olhar para essas questões junto com você e te auxiliar com as estratégias de mudança te ajuda a recalcular rotas e caminhar por novos horizontes. 

Se precisar, estamos aqui para te ajudar! Conte conosco.

Um abraço, Marcela.