Déficit de descanso: por que é tão difícil parar?
Por Priscylla Vasconcellos Bargas | Psicóloga
Estamos acostumados a iniciar muitas de nossas conversas com: “está tudo bem, as coisas só estão corridas, falta tempo”, seguidas de constatações como “preciso de uma boa noite de sono”, ou, então: “preciso de férias! ”. Não é incomum também, na prática clínica, recebermos pacientes com dificuldades em desacelerar, em se permitir descansar, afinal, estamos em uma cultura cada vez mais produtiva, consumista e extremamente estimulada.
Da mesma forma, não é difícil perceber que existe uma grande associação entre descanso com dormir ou simplesmente “não fazer nada”. Muitas vezes, esse “não fazer nada”, significa passarmos horas consumindo conteúdos nas redes sociais ou mesmo maratonando séries, ou seja, ainda assim, sem nos darmos conta de que estamos recebendo muitos estímulos e informações.
Podemos pensar que,
Descanso = sono
Descanso = isolamento/silêncio
São ideias associadas ao descanso de forma passiva, longe do trabalho e de interações sociais. A ideia não é de todo errada, afinal, várias funções restauradoras acontecem enquanto dormimos ou não estamos sob ação do cortisol – hormônio que atua sobre o humor e está relacionado às respostas ao estresse. Entretanto, vale a pena pensarmos que o descanso precisa ser compreendido para além desses momentos. Afinal, como descansar em uma sociedade que não para?
Acredito que tem aumentado o consenso e a compreensão de que estamos exaustos, e que as pausas oferecem um contraponto fundamental na produtividade frenética a qual estamos – todos – inseridos. Se você é mulher, talvez ainda encontre mais dificuldade em obter espaços na sua agenda para atividades suas, com seu ritmo e possibilidade, para atividades eficientemente prazerosas e que possibilitam o bem-estar. Isso ocorre, pois as mulheres estão mais expostas a demandas de cuidado, em tempo integral, como a maternidade, a administração doméstica de tarefas infinitas, conciliando “trabalho fora de casa” com jornadas invisíveis de “trabalho dentro de casa”.
O ponto é que descansar é uma necessidade, assim como se alimentar, se exercitar e dormir. Com isso, é interessante percebermos que reconhecer o que é cansaço e o que é descanso, nem sempre é uma tarefa simples ou acessível de forma fluida, permeando o campo do autoconhecimento. Você pode descansar dormindo, contudo, se você tem percebido que dormir não traz a sensação de descanso suficiente, talvez você precise atender a outras formas de descansar. A psiquiatra Dra. Saundra Dalton-Smith traz a seguinte colocação sobre o tema:
“O resultado é uma cultura com altos níveis de desempenho, altos níveis de produção, indivíduos cronicamente cansados e esgotados. Muitos de nós sofremos de um déficit de descanso porque não entendemos o poder do descanso”, diz a psiquiatra em um trecho de uma palestra ao TEDx Atlanta de 2019.
Em suas pesquisas, a médica pontua que vivemos estímulos diversos ao longo de um dia comum, com muitas demandas e, portanto, necessidades diferentes de encontrar o conforto, a partir de tipos específicos de descanso. Para ela, gastamos energia em todas as atividades que realizamos e, não necessariamente, esse gasto de energia é meramente físico.
Assim, a Dra. Saundra elenca 7 tipos de descanso, complementares entre si, sendo a divisão uma maneira de facilitar a identificação de causas e intervenções possíveis para amenizar o que ela chama de déficit de descanso. Qual seria a solução?
Segundo a psiquiatra:
“O primeiro passo para vencer seu déficit de descanso requer que você identifique onde está usando mais energia no seu dia e então você pode focar sua atenção em obter o tipo de descanso necessário para restaurar essas áreas específicas”.

Na imagem acima, podemos acompanhar alguns “sinais” de que o cansaço está presente em nosso cotidiano e algumas propostas de como encontrar caminhos para que o descanso possa aparecer e ir ganhando cada vez mais espaço. Vejam que são possibilidades que não exigem grandes elaborações e, sim, a escuta particular de cada necessidade.
E se você ficou curioso, segue aqui o link da palestra: The real reason why we are tired and what to do about it | Saundra Dalton-Smith | TEDxAtlanta com outros exemplos e provocações que a própria Dra. Saundra nos faz em sua fala.
As definições propostas por Saundra, mostram a complexidade da temática e com isso, pode se tornar mais fácil não só compreender o que pode estar significando o cansaço, atual ou que tem se estendido há tempos, mas também, favorecer que a percepção e sensibilidade em relação ao corpo, as relações e as emoções.
Espero que a leitura tenha te conduzido a esse olhar pessoal, que somente você tem acesso verdadeiro e livre, para fazer por você. E, mais do que isso: que descansar não é luxo e sim, uma necessidade humana.
Abraços, Priscylla.