Como fortalecer seu filho?

                – Brett, por que o papai ama você?

                – Porque eu faço cocô na privada?

                – Bem, eu realmente gosto disso, mas não é por isso que eu te amo.

                – Então é porque eu não jogo mais comida no chão?

                – É verdade, eu gosto quando a comida fica no prato. Mas não é por isso que te amo.

                – Então por que você me ama papai?

                – Ora, eu gosto de você porque você é você.    

Esse diálogo é de Marshall Rosenberg, fundador da Comunicação Não Violenta e seu filho Brett, de 3 anos. Marshall conta em seu livro “Criar Filhos Compassivamente” como ficou chateado com as respostas do filho, percebendo que ele estava relacionando o amor de seu pai às condições que o pai aprovava. Ele, psicólogo que trabalhou com desenvolvimento e educação, ficou frustrado ao perceber que não estava claro para o filho que ele tinha o amor garantido do pai em duas condições: quando ele fazia o que o pai pedia e quando ele não fazia o que o pai pedia.

Essa compreensão não está sugerindo que os cuidadores sejam passivos e cedam aos diversos desejos infantis, mas que através do respeito e empatia, possam motivar as crianças a fazerem o que os cuidadores precisam que façam. Assim, podem fortalece-las a sentirem-se seguras ao longo de suas vidas.

Sentada do lado de cá na poltrona do consultório, muito observo sobre a forma como os seres humanos entendem o amor. A criança, em seus primeiros anos, estabelece vínculos com seus cuidadores que irão refletir nos próximos vínculos que farão ao longo da vida. Nessa parte não há muito segredo, as pesquisas se expandem a cada ano sobre a importância dos primeiros anos na vida de uma pessoa.

Olhar então para nossa própria história e para a forma que nossos pais conseguiram nos transmitir seu amor irá nos fazer compreender um pouco mais sobre a forma como expressamos e sentimos o amor em nossas vidas.

 Para iniciar a compreensão, é importante entender que o ser humano é um mamífero totalmente dependente nos primeiros anos de vida. Diferentemente da vaca, do coelho, do golfinho, o ser humano, caso seja deixado sozinho, irá correr riscos de vida. Isso é real, e historicamente desenvolvemos o senso de que precisamos desses cuidados. O querido Dr Carlos Gonzales em seu livro Besame Mucho explica detalhadamente sobre as necessidades de nós, mamíferos humanos, nos primeiros anos de vida e deixa claro que evoluímos com características que favoreçam a garantia dos cuidadores perto de nós: choramos alto, buscamos aconchego, afago, damos os braços, relaxamos no colo e sossegamos quando nos sentimos protegidos.

A partir dessa compreensão, entendemos que a criança fará o que for preciso para garantir a sua sobrevivência e a presença de seus cuidadores. É muito importante entendermos que fizemos isso como crianças, e que nossos filhos farão como crianças, não podemos exigir uma compreensão adulta de uma pessoa de 7 anos. Desta forma, quando o cuidador se distancia afetivamente de uma criança, ignorando-a, uma sensação de ameaça de aniquilamento permeia seu corpo infantil. Quando um adulto pune a criança com a retirada temporária de seu amor, a criança entra numa angústia forte, mesmo que ela defenda-se com raiva ou até demonstre indiferença.

Crianças precisam de cuidado e atenção mesmo quando não se comportam da forma como esperamos. E é muito importante que elas saibam que o amor por elas se mantém, mesmo quando elas não se comportam de acordo com nossas expectativas. O pior que podemos fazer para o fortalecimento emocional infantil é ignorar a criança, deixando de falar com ela ou negando cuidados básicos. Essa forma de interação quando os pais estão bravos ou frustrados gera uma sensação que (caso feito repetidas vezes) deixará marcas profundas na forma como esse ser humano olha para si mesmo.

 É importante que os cuidadores olhem para sua história de vida e analisem como seus próprios cuidadores reagiam quando eles se comportavam fora do esperado. Eles ficavam bravos? Ficavam tristes? Retiravam o afeto? Gritavam? Como era? E como se sentiam quando eram crianças? Ao conectar com sua criança interna, vale a pena questionar: que efeitos isso teve em minha vida adulta? A forma como eu sinto que mereço ou não mereço o afeto dos outros, tem suas bases fundamentadas em quais tipos de vínculo? Depois de analisar, podemos olhar para nossos filhos e refletir sobre como podemos fortalecer a forma deles sentirem a vida.

Quando damos nossa instrução sobre os comportamentos que julgamos mais aceitáveis, quando conectamos com as nossas necessidades mas também com as necessidades da criança e deixamos claro que o amor está presente mesmo quando há chateação, frustração e até raiva, estamos mostrando para ela que ela é digna de ser amada mesmo em suas versões não tão “bonitinhas” e “corretas”. Estamos abrindo um campo para a expressão do adulto e também da criança, promovendo o diálogo e a validação das emoções dos dois lados. Nem a criança, nem o adulto saem com a verdade absoluta da situação, é uma construção na relação.

Em resumo, para a criança sentir-se segura dela mesma, ela tem que sentir segurança do amor de seus cuidadores, incondicionalmente. Para isso, não basta que os cuidadores a amem incondicionalmente, eles precisam demonstrar seu amor incondicional mesmo que não gostem de tudo que a criança faz. Assim, esses seres serão adultos com um senso de segurança pessoal e até de uma “autorização interna” de permitirem-se serem bobos, tolos, ou até rejeitados algumas vezes, mas sem a sensação de risco à sua integridade pessoal.

Que nossas crianças possam ser fortalecidas, através da demonstração do amor!