Em Casa, com nossas Emoções

Em tempos de quarentena, somos chamados para lidar com nós mesmos.

Durante a vida que vamos construindo, desde pequenos, encontramos maneiras de nos protegermos de alguns sentimentos. Não só uma proteção de fora para dentro, como por exemplo fugindo de uma bronca dos pais, mas de dentro para fora, fugindo das nossas próprias dores.

Não é fácil, todos nós somos contemplados por todas as emoções, em diferentes dosagens, e vamos aprendendo a lidar com ela ao longo de nossas vidas. Na verdade, são poucos aqueles que realmente são ensinados a lidar com elas.

Meu filho se jogou no chão hoje pois eu tirei um copo de vidro da mão dele. Ele literalmente anda um pouco e se joga, chorando. Meu filho tem 1 ano e 9 meses. É assim que ele expressa a frustração. Como seus pais faziam quando você tinha esse comportamento? Na sua casa era permitido expressar a birra? Podia chorar? Era tudo bem pular pular pular por 4 horas seguidas?

Luiza, o que isso tem a ver com nosso papo sobre as emoções?

Meus queridos, já sabem. É na infância que tudo começa. Se você aprendeu a segurar seu choro, a suprimir a raiva, a segurar o riso por exemplo, é assim que você aprendeu a lidar consigo mesmo. E somos bons nisso. Somos bons em fingir que não sentimos. O problema é que essa estratégia costuma não dar muito certo.

Fugimos de nossas emoções trabalhando demais, saindo demais, falando demais, fazendo coisas demais. São poucos os momentos de pausa, de conexão. Somos bombardeados por entretenimento na palma de nossas mãos. Distrações, distrações, distrações de nós mesmos.

E agora, cada um em sua casa, temos que ficar conosco. Nossas emoções falam e não temos tantas distrações para deixar de ouvi-las. Acordamos e não podemos ir correr no parque, tomar café da manhã na padaria, ir trabalhar. No meio da manhã temos que lidar com nossas famílias ou com nossa solitude. Temos que fazer nossa comida, cuidar de nossa casa, lidar com os desentendimentos, conviver com a angústia de não saber até quando teremos que estar assim.

A noite, o silêncio é maior ainda. Já cansamos de telefone, de TV, falta algo. “Só pode ser essa pandemia, não tem como!”. Hum… Será? Será que essas emoções estão aí apenas agora? Ou será que agora estão tendo uma oportunidade maior de serem ouvidas.

Vamos pensar?

  • Medo da morte: é algo que fugimos de pensar. Pensar sobre o sentido da vida. Em como lidamos com os mais velhos. O que falamos ou não para nossos pais e avós. Com nossa pequenez. Nossa falta de controle sobre a vida. Será que temos tempo para isso no dia a dia?
  • Relacionamento: Meu deus! Que difícil ficar trancado em casa com o parceiro, sem ter um respiro. Agora vamos realmente ter que lidar com nossas diferenças? É isso? Ele acha que sou maluca; Ela acha que sou folgado; Ele acha que não me importo; Ela acha que sou seco. Não sabemos conversar. É a pandemia. Será? Será que já sabíamos? Será que sabíamos conversar sobre desconfortos?
  • Crianças: Como é intenso! Como é difícil sem ajuda! Eles querem muita atenção! Sim. Sempre quiseram. Agora só somos nós. Sem babás, sem avós, sem escola. Eles querem a nós. Querem que fiquemos olhando eles andarem, pularem, desenharem. Querem a nós. Pandemia? Ou sempre quiseram mas nós nem sempre estávamos lá?
  • Pessoas carentes, pedindo nossa atenção: Será a pandemia ou será que agora conseguem dar vazão para o que sentem? Será que conseguem agora falar o que estava adormecido quando a ameaça de morte não estava tão escancarada? Pandemia ou humanidade?
  • Necessidade de calma:Chega! Preciso de paz! Preciso de um respiro! De uma meditação, um mantra, sei lá! Qualquer coisa que acalme minha mente. Essa pandemia está me deixando louco. Isso não é novidade. A necessidade de parar esteve sempre aí. Mas será que dávamos realmente valor para isso? Acho que não, afinal estávamos muito preocupados com nossas distrações…

Sei que não é fácil, afinal não fomos ensinados.

Na realidade fomos ensinados a engolir.

Mas é hora.

É hora de olhar para dentro. Pedir ajuda. Estar presente. Estabelecer a calma. Praticar o silencio. Aprender a conversar.

Estamos todos tentando. Estamos todos ouvindo o que antes era disfarçado por tantas demandas, afazeres, cobranças.

O que seu corpo te diz agora? O que sua mente vibra? O que seu coração te pede?

Vá aos poucos, crianço espaço. Respirando, abrindo o peito. Pés no chão para sustentar as emoções. Estamos todos aprendendo.

Por Luiza Domingues, psicóloga clínica.