Precisamos parar de correr: uma reflexão sobre a ansiedade e o tempo
Por Priscylla Bargas | Psicóloga
Estamos vivendo um tempo em que as informações estão cada vez mais simultâneas aos acontecimentos. Ficamos mais rápidos em “saber” das coisas que acontecem aqui e no mundo, inclusive, tem aumentado a necessidade de acompanhar e responder às demandas da vida em geral, o que tem gerado um cansaço desproporcional. Talvez porque estamos lidando com a sensação constante de que o tempo mudou, ficou mais curto, como se precisássemos de muito mais horas no nosso dia.
E isso tem um custo para nossa saúde mental: temos muito no raso e pouco em profundidade. Já percebeu como rolamos nosso feed, gastamos tempo nos distraindo ou acessando conteúdos interessantes, mas também nos recordamos pouco ou nem lembramos do que foi compartilhado?
Ou mesmo encontramos com frequência pessoas que relatam não compreenderem como alguns dão conta e são tão satisfeitos e bem sucedidos em suas atividades profissionais e pessoais, enquanto não conseguem executar suas atividades com tanta constância ou entusiasmo?
Na clínica, essa demanda aparece com muita frequência. Sensação de inadequação e frustração dos pacientes por não conseguirem executar a lista infinita dos seus deveres: manter a casa em ordem, entregar os relatórios nos prazos, brincar com os filhos e os afastarem das telas, ter momentos de autocuidado, tempo com os amigos. Vale ressaltar que comumente são relatos de pacientes mulheres. Claro que existe o fato de mais mulheres procuram atendimento psicológico, contudo, é importante compreender que existe uma desigualdade nas exigências e cobranças sócio-culturais entre os gêneros.
De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil é o país com maior número de pessoas ansiosas, cerca de 9,3% da população. Uma pesquisa da Think Olga (organização não governamental de inovação social) revelou que 7 em cada 10 diagnósticos de ansiedade e depressão eram de mulheres.
A sobrecarga com tarefas domésticas e de cuidado, o trabalhar fora com baixas remunerações e exposição a situação de violênci@, podem ser fatores externos que colaboram para o cenário preocupante, além dos aspectos individuais.
Pesquisas assim são assustadoras e denunciam a urgência de fortalecermos as pessoas, sobretudo as mulheres, para um movimento contrário: olhar para si, para dentro, para as pausas e para o tempo, do ócio, do tédio, da “improdutividade”. Um processo desafiador, que muitas vezes fica distante perante a prontidão e impaciência, que somos cotidianamente incumbidas: exauridas a dar conta de tudo. Compreender o atravessamento cultural, bem como os aspectos particulares e relacionais, os aprendizados ensinados ao longo da vida, pode ser um caminho frutífero à permissão e protagonismo dessas mulheres.
Sabe quando você está pensando no jantar, na lista do mercado, na consulta do filho, em cortar a franja, tudo ao mesmo tempo? Daí você prefere pegar o celular, como se aqueles minutos te afastasse desses pensamentos ansiosos, mas na verdade deixa ainda mais acelerada? Nesse instante, seria importante parar e sentir. O que vem? Como aparece? Qual será a sua necessidade? Se escute, pois a agitação pode te “contar” que quando se está cansado, há de se descansar.
Momentos em que se experimenta um banho mais demorado, sem que se passe mentalmente a lista infinita de pendências; retomada de ocasiões em que se encontra as amigas para um café; aquela tarde, depois do almoço, ótima para colocar o sono em dia; colocar aquela música e dançar, em frente ao espelho para ver se você faz careta quando joga o cabelo. Provavelmente, pedir ajuda, solicitar um tempo só para você é uma boa pedida.
É sabido que a ansiedade pode causar sintomas físicos e emocionais como tonturas, tremores, falta de ar, palpitações, desmaios, isolamento, compulsões, baixa autoestima. Assim, alguns prejuízos podem ser observados no dia a dia e podem, inclusive, serem trazidos mais uma vez para debaixo do tapete: “olha como que para mim tudo é demais, enquanto todo mundo vive sua vida de forma satisfatória, estou aqui sofrendo além da conta, só porque não consigo realizar uma tarefa simples”. E uma necessidade de cuidado que aparece como “sintoma”, passa a ser negligenciado por nós mesmos.
Então, deixo aqui um convite. Qual a necessidade ou sintoma que insiste em aparecer e qual o destino está sendo dado?
A psicoterapia e acompanhamento com médico psiquiatra são fundamentais para o tratamento adequado, portanto, não hesite em procurar ajuda.
Abraços,
Priscylla Bargas | Psicóloga – CRP:06/111602